Pierre Verger
galeria marcelo guarnieri | ribeirão preto
abertura
31.05.2019 / 10h – 18h
período de visitação
31.05 – 31.08.2019
rua nélio guimarães, 1290
ribeirão preto – sp – brasil / 14025 290
[ mapa ]
Organizada juntamente com a Fundação Pierre Verger, a Galeria Marcelo Guarnieri apresenta, em sua sede de Ribeirão Preto, exposição individual do fotógrafo, etnólogo, antropólogo e pesquisador Pierre Verger (1902-1996). A mostra esteve em cartaz no Museu Oscar Niemeyer, em Curitiba, de setembro de 2018 até março de 2019 e conta com cerca de 150 fotografias que foram feitas entre as décadas de 1930 e 1960 nas diversas viagens que fez pelos cinco continentes, além de publicações e materiais de arquivo como documentos e provas de contato. Os núcleos que organizam a exposição destacam diferentes momentos da produção de Verger, sendo eles: Vintages mais antigos, Fotógrafo para imprensa, Segunda Guerra Sino-Japonesa, A Segunda Guerra Mundial, O Nordeste brasileiro, Os cultos afro-brasileiros, Reconhecimento retrospectivo no Brasil – Corrupio (anos 80) e Reconhecimento retrospectivo internacional – Revue Noire (anos 90).
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Vintages mais antigos
Além de algumas fotos de família realizadas no início do século XX, os vintages mais antigos presentes no acervo da Fundação Pierre Verger são ampliações realizadas na Europa no início da década de 1930. É um material precioso, já que os negativos correspondentes foram perdidos durante a guerra. Esse material apresenta um aspecto do trabalho de Verger pouco conhecido – fotos de lazer na França –, anunciando, entretanto, seu interesse pelos corpos, especialmente pelo nu, assim como a busca de horizontes fora da cidade. Nessa época, Verger também produziu vintages das suas fotos feitas na Polinésia para sua primeira exposição realizada no Museu de l’Homme, em 1934.
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Fotógrafo para imprensa
Em dois anos (1932-1934), Verger passou de fotógrafo amador a um dos fotógrafos mais publicados na imprensa francesa. Foram identificadas mais de 1.200 fotografias diferentes de Verger publicadas em jornais, revistas e livros, de 1934 a 1939: as primeiras, no jornal francês Paris-Soir, e depois nos mais diversos suportes, notadamente em prestigiosas revistas como Life, Daily Mirror, Arts et Métiers Graphiques. Muitas dessas imagens foram publicadas através da agência Alliance-Photo – precursora da Magnum – graças ao interesse da diretora Maria Eisner pela produção de Verger. Existem muitos vintages dessa época provenientes do acervo da Alliance-Photo, o material era utilizado para apresentar os clichés dos fotógrafos aos clientes da agência.
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Segunda Guerra Sino-Japonesa
É verdade que Verger foi um fotógrafo completamente livre, escolhendo o destino das suas viagens e, consequentemente, os assuntos que fotografava, mas há algumas exceções. Uma delas se deu quando foi contratado para fazer a cobertura da Segunda Guerra Sino-Japonesa, já no final do ano de 1937. A pedido de Maria Eisner, uma das fundadoras da Alliance-Photo, produziu um material que concorreria no mercado com o de ninguém menos que Robert Capa, que também havia ido cobrir o conflito. Mas Verger, segundo seus próprios termos, não era muito corajoso e nunca falou tanto a respeito das fotos feitas nessa época. Apenas comentou que achava muito “estranho” estar cobrindo um conflito horroroso que gerou tantos mortos, mas sem correr nenhum risco, já que ele e outros repórteres ficavam hospedados em “Concessions” protegidas por leis internacionais. Os vintages aqui apresentados foram utilizados pela agência Alliance-Photo e acabaram sendo publicadas em importantes revistas da época, como Life e Regard. Apesar de não gostar desse material, Verger aceitou o pedido para poder seguir para as Filipinas, país para onde queria muito voltar. Uma das caixas-arquivo que Verger usava para preservar e organizar pequenos envelopes com provas de contato identificadas e catalogadas, assim como outras placas de contato preparadas pelo fotógrafo também integram este núcleo.
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A Segunda Guerra Mundial
Durante a guerra, encontrando-se no continente sul-americano, Verger não pôde mais contar com a Alliance-Photo para publicar suas imagens. Viveu anos difíceis, mas continuou publicando. Em um primeiro momento, na Argentina – onde ficou por dois anos –, notadamente na revista Mundo Argentino, para a qual já entregava conjuntos de imagens, formando o que se pode considerar como fotorreportagens, já que são acompanhados de textos, o que pouco fazia até então. Em um segundo momento, no Peru, onde trabalhou para o Museu de Lima, para quem realizou um trabalho de caráter mais antropológico sobre a cultura andina. Parte desse trabalho foi publicado num dos primeiros fotolivros feitos na América Latina, também um dos primeiros registros de antropologia visual: Fiestas Y Danças em Cuzco.
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O Nordeste brasileiro
Quando Verger voltou ao Brasil, em 1946, conseguiu trabalhar como fotógrafo por meio de um contrato assinado com O Cruzeiro, maior revista sul-americana da época. Seguiu assim para o Nordeste, onde realizou, de 1946 até o final de 1948, um de seus mais importantes trabalhos sobre a cultura popular nordestina. Não somente a cultura afro-baiana, mas também do interior da Bahia, de Pernambuco, Alagoas, Paraíba… No acervo do fotógrafo existem muitos vintages agrupados por temática, com textos e legendas, formando fotorreportagens que foram publicadas tanto na revista brasileira O Cruzeiro – muitas vezes com textos de Odorico Tavares – quanto em revistas internacionais.
Pierre Verger
galeria marcelo guarnieri | ribeirão preto
opening
May 31, 2019 / 10am – 6pm
exhibition
May 31 – August 31, 2019
rua nélio guimarães, 1290
ribeirão preto – sp – brasil / 14025 290
[ mapa ]
Os cultos afro-brasileiros
Desde sua chegada na Bahia, Verger se encantou pelos cultos afro-brasileiros. Muito bem recebido no mundo do candomblé da Bahia e de Xangô do Recife, ele aproveitou seus contatos com antropólogos (Bastide, Monod, Métraux) para poder voltar ao Benim e melhor entender as similitudes entre a cultura afro-baiana e as dos países do Golfo do Benim (Benim e Nigéria). Foi a partir daí que tornou-se um estudioso do culto aos orixás, com uma bolsa de estudos partiu para a África onde renasceu como Fatumbi “nascido de novo graças ao Ifá” e foi iniciado como babalaô, um adivinho através do jogo do Ifá. Essa volta para a África, em 1948, foi a primeira de inúmeras viagens que aconteceram sem descontinuidade até o final da década de 1970. Sua pesquisa, que resultou tanto em livros, escritos, fotografias e exposições, é tida como obra de referência para os estudos sobre a cultura afro-diaspórica. Além de publicar essas fotografias em livros de caráter cada vez mais antropológico (Dieux d’Afrique), Verger também as utilizou diretamente, apresentando impressões de formato pequeno (24 x 18 cm) aos seus interlocutores – não só aos pesquisadores, mas também às próprias figuras retratadas. Na década de 1990, o fotógrafo Mario Cravo Neto fez algumas ampliações dos negativos referentes ao candomblé na Bahia, essas também integram o conjunto deste núcleo.
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Reconhecimento retrospectivo no Brasil – Corrupio (anos 80)
Os “problemas“ enfrentados por Verger na Nigéria, em 1978, marcaram o fim das suas longas viagens para a África. Graças a uma parceria com novos colaboradores, seus trabalhos foram publicados pela primeira vez na Bahia através da Corrupio, editora criada inicialmente para lançar seus trabalhos. Diversos livros foram publicados com sucesso, seguidos de exposições no Brasil, sobre as temáticas baiana e afro-baiana e também sobre a China, em Shangai. Além de livros como Orixás: os deuses iorubás na África e no Novo Mundo de 1981 ou até mesmo o boneco original de 50 anos de fotografias de 1982, podem ser vistas algumas ampliações das imagens que foram reproduzidas em seus livros.
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Reconhecimento retrospectivo internacional – Revue Noire (anos 90)
Durante a década de 1980, a equipe de fotógrafos que participou da Alliance-Photo foi destacada numa exposição com catálogo e o nome de Verger reapareceu timidamente no circuito fotográfico francês. Mas foi no final dos anos 1980 e início dos anos 1990 que uma grande exposição na Suíça e em Paris – no Musée d’Art d’Afrique et d’Océanie –, com ampla divulgação, ofereceu uma visibilidade inédita à obra fotográfica de Verger. A mostra foi organizada pela Revue Noire, uma das primeiras revistas a destacar a arte contemporânea africana no mercado ocidental. A exposição apresentou, pela primeira vez após a Segunda Guerra, ampliações de boa qualidade e vintages assinados por Verger, alguns dos quais presentes nesta mostra. As imagens foram feitas entre os anos de 1930 e 1960 e apresentam cenas de rua, de trabalho, de festa e de descanso em diversos países como Peru, Bolívia, Vietnã, Estados Unidos, Japão, Cuba, Brasil e Nigéria. Le Messager – catálogo da mostra – foi também distribuído nos Estados Unidos, onde Verger era representado por uma galeria indicada por Mario Cravo Neto, amigo baiano que realizou as ampliações de Verger comercializadas nesse local.
As fotografias de Pierre Verger trazem o registro de manifestações espontâneas da vida humana, priorizando as minorias culturais e situações de contato. Sua câmera Rolleiflex, carregada à altura do peito, lhe permitia aproximações menos invasivas e enquadramentos menos calculados por não se posicionar diante dos olhos. Desse modo, a câmera era mais um instrumento de apreensão de momentos de contato com o outro e a imagem gerada, a expressão de um evento ainda pouco elaborado pela consciência. Para Verger, a fotografia tinha funções estéticas, documentais, afetivas e políticas, e cumpria um importante papel enquanto discurso sobre fotógrafo e fotografado. Em suas palavras: “A fotografia permite ver o que não tivemos tempo de ver, porque ela fixa. E mais, ela memoriza, ela é memória.”
Pierre Verger
1902 – Paris, França
1996 – Salvador, Bahia
Além de fotógrafo, Pierre Verger era também etnólogo, antropólogo e pesquisador. Durante grande parte de sua vida, esteve profundamente envolvido com as culturas afro-brasileiras e diaspóricas, direcionando uma especial atenção aos aspectos religiosos, como os cultos aos Orixás e aos Voduns. Antes de chegar à Bahia, no Brasil, em 1946, Verger trabalhou por quase quatorze anos viajando pelo mundo como fotógrafo, negociando suas imagens com jornais, agências e centros de pesquisa, e em Paris, mantinha ligações com os surrealistas e antropólogos do Museu do Trocadéro. Nos quatro anos que antecederam sua chegada, passou pela Argentina e pelo Peru, trabalhando por um tempo no Museo Nacional de Lima. Ao chegar no Brasil, colaborou com a revista O Cruzeiro e em Salvador, onde foi viver, pôde registrar, de uma maneira muito particular, o cotidiano de uma cidade essencialmente marcada pela cultura da África Ocidental. Seu fascínio por aquilo ou por aqueles que fotografava ia além da imagem, havia um interesse pelo contexto, suas histórias e tradições, algo que pode ser notado não só em seu trabalho com a fotografia, mas também com a pesquisa. Pierre Verger integra-se de tal maneira à Bahia e sua cultura que em 1951 passa a exercer a função de ogã no terreiro Opô Afonjá de Salvador e no Benin, África, torna-se babalaô.